Entrevista com Ivo Camargo

Conte-nos um pouco da sua trajetória.

A minha porta de entrada no mercado foi o livro didático. Comecei, há quase 45 anos, como divulgador. Depois, fui tendo uma tendência natural para a área comercial e, após dez anos, migrei para o chamado trade. Quando fui trabalhar na Companhia das Letras o crescimento foi muito grande, pois estávamos construindo a trajetória de uma das maiores e mais importantes editoras do país. E este é um desafio que eu gosto, por isso aceitei a proposta de ir para a Cosac & Naify. Meu tempo no Grupo Ediouro também foi um grande destaque na minha carreira, pois foi uma fase em que vendemos muito e compartilhávamos (nós, equipe de vendas) deste mérito com o time editorial, que era primoroso. Decidir abrir minha própria empresa foi desafiador, mas importante para uma mudança na carreira, mesmo que ainda no setor livreiro; o que me trouxe novas perspectivas.

O senhor esteve envolvido com o lançamento dos livros "O Xangô de  Baker Street", de Jô Soares, e "O anjo pornográfico", de Ruy Castro, e  tantos outros best-sellers. Como foi trabalhar com estes livros?

Trabalhar com esses livros é muitos fácil: autor bom e literatura de qualidade vende fácil e praticamente sozinho. Além disso, há um trabalho muito forte desses autores de divulgação do próprio livro, e isso ajuda demais.

Como surgiu a ideia de modificar a comercialização de livros no Brasil, implantando a venda sob consignação?

Era claro que o livreiro não tinha capital de giro: era necessário pensar em uma solução em que o editor ajudasse o livreiro a apostar nos títulos, que nem sempre se tornavam fenômenos de vendas. Com o risco exclusivamente nas mãos do livreiro, era bastante complicado ter um estouro de vendas. Alguns países da Europa praticavam (e praticam até hoje) o que eu chamo de ‘consignação enrustida’, que é a venda com direito de devolução. A ideia do consignado foi uma adaptação ao que entendi que faria sentido no nosso mercado. E, apesar de todas as críticas – e há muito o que se criticar – este é ainda o método mais utilizado (eu arriscaria dizer que, exceto pela Amazon, o único) para a comercialização de livros no Brasil.

Como foi a decisão de montar a Ivo Camargo – Soluções Comerciais depois de vários anos trabalhando nas mais importantes editoras do país?

Sempre tive vontade de trabalhar com produtos que faltam no mercado. A IVO CAMARGO surgiu para dar oportunidades às pequenas editoras, que tinham publicações de qualidade, mas não tinham espaço no mercado de gigantes.

Quais são as atividades desenvolvidas pela empresa?

Basicamente, oferecemos os serviços de representação comercial e consultoria. Funcionamos como um departamento comercial terceirizado, ou seja: apresentamos a marca e o produto aos players do mercado, fazemos os cadastros de metadados, tiramos pedidos, cobramos acertos de consignação, fazemos reposição e colocação das novidades: rotina de um departamento comercial, porém, compartilhado com diversos clientes. Além disso, pensamos junto ao editor o processo de publicação, precificação do produto, sugestões de ações, lançamentos etc.

Como está o mercado literário brasileiro? As pessoas têm comprado livros apesar da crise?

Houve uma queda geral de faturamento, não só no setor do livro, mas de praticamente todos os setores do varejo. Porém, ainda há procura pelo livro e as vendas seguem em um ritmo mais lento, é claro; mas seguem. E é nisso que o nosso mercado deve focar: como vender nas atuais circunstâncias? O que vender? E para quem vender?

Que conselhos o senhor daria para quem acaba de publicar o seu  primeiro livro? E para as pequenas editoras?

O caminho do autor independente que publica livro físico é bastante complicado no nosso mercado, por isso, sugiro que o autor esteja sempre vinculado à uma editora, até para respeitar a cadeia do mercado. E o pequeno editor deve aprender ao máximo como funciona este mercado e não abrir mão de investir em uma equipe de vendas (mesmo que seja de um único vendedor ou terceirizado) eficiente.

O senhor acredita que livros impressos e digitais conviverão de  forma harmoniosa por um longo tempo, com os leitores mantendo a preferência pelos livros impressos?

Sim, é claro. O consumo do livro digital (ebooks e audiobooks) ainda é ínfimo no Brasil (embora tenha tido um crescimento considerável desde o início da pandemia); mas até pelo exemplo dos EUA e Europa, o digital não veio para roubar o público do físico, mas sim para somar.